sábado, 9 de agosto de 2014

OS PAIS - TESTEMUNHO DE LISSI BENDER


Estou tomando chimarrão, enfeitado com um raminho de Macela, enquanto penso nas duas pessoas para sempre incrustadas, feito pedras preciosas, em minha alma. Falo aqui de uma delas. Na minha  infância não havia dia do pai,da mãe, da criança. Mas isso era um tempo em que todos os dias eram dias para serem vividos juntos, um tempo em que que se aprendia o sentimento de pertencimento através da união de esforços pela reprodução da vida, pelo bem coletivo; em que se aprendia valores na convivência e no contato com o mundo natural. De meu pai aprendi  a valorizar as coisas pelo que significam e não pelo preço. Com ele aprendi desprendimento. Com ele aprendi a felicidade contida no ato de presentear em si. Dar, doar sem esperar algo em troca, sem interesses outros que não o sentimento advindo do ato em si.

Ao meu Papa Erwin foi reservado vida curta  e muito laboriosa. Era um ser suave, sua fala era suave, sempre muito contido, eu era sua parceira no chimarrão desde pequenina. Gostava de me colocar sentada sobre suas pernas cruzadas, segurava minhas mãos frágeis e juntos cantávamos: “Hopp, hopp, hopp, Pferdchen lauf galopp. Über Stock und über Stein ....”

Minha eterna saudade está impregnada de muitas marcas suas, entre elas o dia em que juntos pescávamos, ambos com água até o joelho, e ele  partilhava comigo seu sonho de aliviar sua carga pesada de trabalho que ia desde o vislumbrar das primeiras luzes do dia até  o cair da noite. Então viria mais vezes me visitar e juntos iríamos fazer muitas pescarias. Uma semana depois  ausentou-se para sempre, sem aviso prévio. Contava então 56 anos. Para sempre ausente, continua presente em cada chimarrão.