terça-feira, 20 de agosto de 2013

UM PITO DE MEU PAI QUE MUDOU MINHA VIDA


Colei grau em Direito pela UFRGS em 17 .12.1969. À tarde do mesmo dia compareci ao gabinete do General Ibá, Secretário de Segurança e lhe apresentei meu pedido de exoneração do cargo de delegado de Polícia (  na época bastava ser acadêmico de Direito ) concurso no qual  tirara o 1. Lugar. O General se impressionou, tentou me dissuadir mas eu estava resolvido.

Advoguei dois anos em P. Alegre e resolvi prestar  concurso para juiz de direito. Fui aprovado e, como me achava meio fraco na área de Direito Privado, decidi escolher uma comarca longínqua. Recém tinha sido criada a de Horizontina e optei por ela. O prefeito era Walter Buendchen, avô da famosa Gisele.

No dia 1 de janeiro de l972 saí com meu carro de P. Alegre, carregado de malas e livros, solito no más. Passei por Estrela e Lajeado e dali em diante tudo me era desconhecido. Cruzei por Soledade e fui até Carazinho. Ali tinha que dobrar a oeste pela 285. Tudo estrada de chãol. Chovia. Barro e pedras, fui indo, Panambi, Ijui, tudo barro vermelho. Parei já de noite em S. Ângelo e me hospedei num hotel ao lado da rodoviária. A noite toda ouvi os ônibus roncarem. Cedo prossegui, fui até Giruá, onde me disseram que era melhor pegar um atalho para Três de Maio. Atolei várias vezes mas cheguei . Dali a Horizontina era um barral e fui atolando e atolando até que perto do meio dia cheguei .Só tinha uma rua calçada. Nas outras   era pura lama. Parei num Posto de gasolina ( o único) e perguntei qual o melhor hotel da cidade. Deram risada:

- só tem um mas está  fechado, o pessoal está de férias numa “ praia” do rio Uruguai.

- mas não tem ninguém cuidando do hotel?

- sim, tem uma empregada.

Fui no tal hotel que era de madeira. A empregada não se emocionou com meus argumentos e não me deixou entrar. Voltei a Três de Maio e me hospedei num hotelzinho.

Dia seguinte voltei a Horizontina e me informaram que não havia casas para alugar, que tudo estava ocupado pelos empregados da Schneider Logemann. Voltei ao hotel de madeira e me deram um quarto. As frestas entre as tábuas eram tapadas por jornais. De noite baratas circulavam sobre minha cama e sobre meu rosto. O Prefeito  conseguiu me arrumar um chalé de madeira e me mudei para lá.

Era quente, abafado, não pegava TV nem rádios da capital, o jornal chegava dia seguinte. Era o velho oeste.

Me senti o mais infeliz dos homens, chorei uma noite inteira e no dia seguinte falei ao escrivão Antônio Reck

- seu Antônio, vou dar um pulo em P. Alegre e volto semana que vem.

Peguei minha máquina de escrever, datilografei meu pedido de exoneração e estava resolvido a reabrir meu escritório, onde estava ganhando o dobro do salário de juiz.

No meio da tarde cheguei em Lajeado e decidi ir para a casa dos meus pais em Santa Cruz. Precisava chorar junto com minha mãe. ( Quando eu chorava perto dela, mesmo já adulto, ela chorava junto e seus olhos ficavam muito azuis).

-Na! Was machst Du hier?  Admirou-se meu pai.

Respondi-lhe que ia pedir demissão.

Relatei-lhe todas as minhas decepções, contei-lhe das baratas.

E ele, em alemão ( que traduzo):

-Nossa, com medo de baratas? Sentindo falta de TV? Assustado com o barro? Mas nem te conheço mais! E nossos antepassados que vieram por meses no mar tempestuoso? Aqui era tudo cheio de cobras e animais ferozes e agora tu te assustas com baratas? Tu não estás certo da cabeça!  Vamos tomar uma cerveja!

E a todo momento ele me dizia gargalhando: olha bem se não tem uma barata dentro do copo!  Hahaha

De manhã cedinho  retornei para Horizontina. Semanas depois já estava feliz e adaptado....